O novo espetáculo do Folias, coletivo de teatro, intitulado «Êxodos: o eclipse da terra», estreou no próximo dia 4 de Fevereiro. O texto, sobre as migrações reais e metafóricas de um grupo de personagens vindos dos quatro cantos do mundo, foi escrito pelos próprios atores, a partir das suas experiências pessoais, inspirados pelas obras do escritor Gabriel García Márquez e do fotógrafo Sebastião Salgado. O espetáculo tem direção de Marco Antonio Rodrigues – diretor premiado pelas montagens de «Otelo» e «Copenhagen», entre outras  – e supervisão da escrita de cenas do dramaturgo português Jorge Louraço. «Êxodos» é um requiem teatral e o fim – ou a fuga – de um ciclo iniciado com «Orestéia – o canto do bode», em 2007.


Êxodos faz eco, por entre os contos e as palavras de García Márquez e as fotos e legendas de Sebastião Salgado, de alguns excertos da Bíblia e de alguns réquiem (Mozart, Britten, Glass). No nosso espetáculo, uma personagem pivô, na forma de anjo-narrador, sugere a figura do artista que revê a vida em retrospectiva. É como se os anjos, habituados a falar com as pessoas durante o sono, em sonhos, estivessem perdidos nos sonhos do início do milênio, sem reconhecer os caminhos e as portas, e sem chaves para entrar nessas casas que habitamos enquanto dormimos; e assim sendo, perdessem a capacidade de voar, as asas ossificando lentamente até ao dia em que não batem mais; e como se estes deuses abandonados quisessem perceber o que está acontecendo, e este espetáculo fosse a última vontade do anjo-narrador. A figura do artista revisita os seus passos. Inspirações maiores para esta fábula foram Sonhos, de Akira Kurosawa, ou 8 1/2, de Fellini, claro.



«Êxodos – o eclipse da terra» é como um retrato do planeta onde se registraram as migrações mundiais e, fazendo zoom, a história de seis personagens em fuga do território a que estavam originalmente confinados. A partir de várias idéias de êxodo (a parte final das tragédias gregas; a longa viagem dos judeus em busca da terra prometida; os relatos de emigrantes brasileiros na Europa e na América do Norte; o trabalho fotográfico de Sebastião Salgado; e os «contos peregrinos» e histórias fantásticas de Gabriel Garcia Marquez) e das experiências dos próprios atores e do restante da equipe – experiências de fronteira, de limite, de desencaixe do território nacional – tentamos materializar a fuga para fora de si mesmo.

O espectáculo não pretende desmontar a realidade ou defender uma tese, como fizeram antes «Otelo» (um dos melhores espetáculos de 2006, segundo o jornal Público, de Portugal) ou «Orestéia» (prêmio da crítica no Festival Internacional de Teatro de Havana, em 2009). O grupo tenta provocar uma vivência, em forma de alegoria viva, sobre as despedidas, as últimas palavras, as saídas possíveis.